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Daniela Colin – A tecnologia como aliada na ressignificação dos eventos em um cenário de pandemia

* Daniela Colin
A tecnologia contribuiu para que o segmento de eventos continuasse em movimento e a adoção de plataformas virtuais se tornou uma alternativa viável para minimizar os impactos da pandemia. Segundo a Associação Brasileira de Eventos (Abrafesta), esse setor movimentava cerca de R$ 270 bilhões e, como um dos mais afetados no início da pandemia, registrou queda de 95% no faturamento nacional em 2020. Porém, encontrou uma forma de recuperação do capital na modalidade on-line e levou empresas de tecnologia a crescerem até 400% em serviços de transmissões ao vivo.
Desde o começo do ano passado, eventos já consolidados precisaram ser adaptados para que pudessem acontecer e fazer a economia girar, alguns que não aconteceram no primeiro semestre, modificaram a roupagem e se lançaram no mundo digital. Sendo assim, feiras e eventos usaram da medida emergencial para se manterem em movimento e se reinventaram, formando novas concepções relacionadas ao futuro. Mesmo com tantos desafios e ainda sem previsão de retomada total, esse setor que é responsável por geração de emprego e oportunidades de negócios se reconstrói trazendo novas maneiras de continuar lucrativo.
Um exemplo recente foi a última edição da Consumer Electronics Show (CES), a maior feira do mundo de tecnologia, que aconteceu totalmente on-line este ano. O evento, que normalmente aguça os cinco sentidos do público no formato presencial, foi recebido positivamente e, apesar de não substituir o acontecimento face a face, obteve um bom nível de experimentação. Além disso, permitiu a acessibilidade, uma vez que as pessoas puderam participar mesmo não estando em Las Vegas, onde as edições ocorrem anualmente. Participantes de todo o mundo tiveram a oportunidade de conhecer e prestigiar a reunião de inovações e lançamentos de grandes marcas.
As empresas expositoras apresentaram diversas inovações como carros que funcionam com reconhecimento facial, máscaras com fone de ouvido e microfone, escova de dentes smart, uma cozinha robótica que se limpa sozinha e faz 5 mil receitas e muito mais, por meio de keynotes ao vivo, stands virtuais com vídeos, demonstrações programadas e disponibilizaram informativos ao público. Os interessados tiveram a possibilidade de pesquisar pelo fornecedor que desejavam ver e puderam acessar o perfil individual dele dentro da plataforma da CES, para conhecer novidades que agregassem em suas produções.
É de se esperar que o show de som e luz que encanta as pessoas em um evento presencial não surta o mesmo efeito e o elo que o networking cria nesses eventos não seja forte o suficiente na versão digital, mas os conteúdos e apresentações elaborados pelos expositores são essenciais para manter a atenção dos participantes, e ganham perenidade para serem explorados posteriormente, uma vez que ficam disponíveis para eventuais consultas por mais alguns dias após o término do evento on-line.
Contudo, é muito importante que as empresas participem de feiras como a CES, mesmo que em uma edição virtual, afinal, é a chance de acompanhar e se antecipar aos impactos da Covid-19 na tecnologia, seja no direcionamento dos produtos para as novas necessidades dos usuários ou para a movimentação da cadeia de fornecimento. Também é necessário para entender o quanto essas mudanças vieram para ficar e como o mundo vai se comportar diante de toda essa experiência, seja na indústria, no varejo, ou como usuário final.
A movimentação da sociedade incorporou novas tendências no mercado de tecnologia, como a Telemedicina e diagnósticos feitos por avatares e Inteligência Artificial, ou a robótica, a automação comercial e industrial e a Internet das Coisas – algumas que irão se manter e outras que podem ser deixadas de lado no futuro – e só quem está realmente bem informado pode acompanhar e aproveitar o momento de descoberta e inovação. Os eventos digitais entregam o prometido no quesito novidades tecnológicas, conectam pessoas de qualquer lugar do mundo e expandem relações. Em cinco dias de caminhada é possível olhar para o lado, comentar com brilho nos olhos e encontrar oportunidades impensadas em qualquer esquina de um pavilhão, mas, apesar da dificuldade de curadoria, virtualmente também é possível garimpar diferenciais ou pontos de interesse em stands individuais e virtuais.
Houve inúmeras realizações de eventos nos últimos meses – na modalidade on-line, híbrida ou drive-in – e todas precisaram do apoio do público e dos organizadores para que a missão fosse um sucesso. Eventos de tecnologia são verdadeiros shows, são mágicos, e precisam se reinventar, pois o futuro do setor está fundamentado nas decisões que serão tomadas agora. Apresentações híbridas que contem com o ambiente on-line e presencial já podem (e devem) estar nos planejamentos do mundo pós-pandêmico, ao englobar a interação pessoal, as discussões face a face, a inclusão e, acima de tudo, a acessibilidade, para que pessoas de todas as partes do planeta tenham a oportunidade de se envolver com a inovação e a evolução da tecnologia.
Há um caminho árduo pela frente para que essas questões sejam desenhadas e praticadas no futuro do mundo dos eventos. Mas há vantagens significativas nos eventos híbridos ou virtuais como a possibilidade de expansão do público convidado, redução de custos, extensão do ciclo de vida do evento com a perenidade do conteúdo, flexibilidade e conveniência. A questão do networking pode ser resolvida com ferramentas tecnológicas que unam dois participantes em uma conversa durante o evento, ou mesmo uma solução com salas de fornecedores onde os interessados possam tirar suas dúvidas sobre os produtos oferecidos. O mais importante é perceber como a tecnologia é aliada nesse sentido e ressignificará a construção dos eventos de hoje em diante, sejam eles on-line, híbridos ou presenciais.
*Daniela Colin é Diretora de Desenvolvimento de Novos Produtos na Positivo Tecnologia.
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A COP30 e o rótulo como instrumento de política pública: O papel das marcas nessa construção

*Valmir Rodrigues
Enquanto o mundo comenta os avanços e o que poderia ter sido melhor na COP30, milhões de pequenos produtores e povos indígenas seguem invisíveis nas embalagens – e também no dinheiro que circula pelas cadeias de consumo. No fim, não são governos nem organismos internacionais que definem o ritmo de uma transição justa, mas o cidadão comum, que exerce poder diariamente por meio de suas escolhas de compra.
Quando o assunto é clima, o imaginário coletivo se volta quase sempre ao petróleo e às florestas. No entanto, quem realmente mexe o ponteiro, todos os dias, é o sistema de consumo, começando pelo alimento, responsável por cerca de um terço das emissões globais de gases de efeito estufa. Cada vez que alguém enche o carrinho no supermercado, decide não apenas o que vai comer, mas quais produtores, territórios e modelos de negócio vai financiar.
O documento final da COP30, em Belém, aponta para um mundo em transição: triplicação do financiamento para adaptação, reforço da justiça climática e maior centralidade da Amazônia no debate. É um passo relevante. Mas permanece sem resposta a pergunta essencial: como essa ambição chega ao prato do consumidor e, sobretudo, às mãos de quem produz o que está nesse prato?
No Brasil, essa questão ganha nome e endereço. Segundo o Censo Agropecuário, cerca de 3,9 milhões de estabelecimentos de agricultura familiar representam 77% de todas as propriedades agrícolas do país e respondem por grande parte da comida consumida diariamente. Ao lado deles, as Terras Indígenas ocupam aproximadamente 13% do território nacional e concentram algumas das áreas mais bem preservadas do país. As imagens de satélite mostram isso de forma inequívoca: onde há terra indígena demarcada, a floresta permanece; onde não há, a pressão avança rapidamente.
São justamente esses grupos – pequenos produtores e povos indígenas – que figuram nos discursos da COP30, mas continuam à margem das principais decisões e quase ausentes das embalagens, dos rótulos e do fluxo econômico das cadeias de consumo.
Fora das salas de negociação, as pesquisas mostram que metade ou mais dos consumidores já aceita pagar um valor maior por produtos considerados sustentáveis, e que itens com alegações ambientais e sociais crescem mais em vendas do que concorrentes “neutros” na mesma gôndola. Não falta boa vontade do consumidor; falta transparência, linguagem acessível e modelos de negócio que garantam que esse valor adicional chegue à base da cadeia – às famílias agricultoras e às comunidades indígenas que o Pacote de Belém promete proteger.
É nesse ponto que surge o grande desafio, mas também uma enorme oportunidade para a indústria de alimentos e para as marcas de forma geral: transformar o Pacote de Belém em produtos e embalagens capazes de falar a linguagem do consumidor e criar uma ponte direta com quem produz. Isso significa abandonar o “green talk” genérico e adotar informações que conectem o público ao território de origem, apresentem propriedades, cooperativas, comunidades e terras indígenas, e expliquem de maneira simples como cada escolha contribui para manter a floresta em pé ou fortalecer um pequeno produtor. Também significa incorporar indicadores claros de justiça na cadeia, mostrando de forma objetiva qual parcela
do valor pago chega ao campo e substituindo selos abstratos por transparência concreta e compreensível.
A embalagem pode se tornar, mais do que um recurso de marketing, uma ferramenta de política pública. Ela pode aproximar produção e consumo quando fizer sentido, especialmente em alimentos frescos, onde transporte e cadeia fria têm grande peso nas emissões, ajudar a reduzir desperdício ao oferecer informações claras sobre porções, conservação e uso integral, e mostrar, com números simples e histórias reais, como aquela compra financia territórios e modos de produção específicos, e não apenas uma marca
distante da realidade do campo.
Depois da COP30, a disputa não se limita ao texto de documentos internacionais, mas se estende à confiança na ponta da cadeia. As marcas que conseguirem demonstrar, com dados acessíveis e linguagem clara, que transformam a vontade do consumidor em renda e proteção para pequenos produtores e povos indígenas vão sair na frente.
Algumas já dão os primeiros passos: utilizam QR codes que mostram a fazenda, a cooperativa ou o território de origem; simplificam embalagens para contar histórias concretas em vez de slogans genéricos; e testam modelos nos quais uma parcela do preço é vinculada diretamente a projetos em comunidades rurais. A maioria, porém, ainda permanece no slide da COP, distante da gôndola.
No fim, a pergunta central não é se o Pacote de Belém foi ambicioso o suficiente. A verdadeira questão, para o Brasil e para o mundo, é outra: o pacote que o consumidor leva para casa continuará mudo sobre quem produz, quanto recebe e que impacto gera, ou finalmente passará a contar a verdade que uma transição justa exige?
*Valmir Rodrigues – Fundador da My Trusted Source (MyTS) .
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Imersão além do jargão: o que as marcas precisam entender agora

*Alexis Anastasiou
Nos últimos anos, palavras como “imersivo”, “360°” e “cenografia imersiva” se tornaram quase um clichê no mercado de brand experience. Conceitos originalmente associados a projetos de alta complexidade criativa passaram a ser usados para qualquer evento com LED ou projeção. O resultado é previsível: quando tudo é imersivo, nada realmente é.
Mas existe uma confusão central nesse debate. Imersão não é estética, é propósito.
É a capacidade de tirar o público do óbvio, deslocando percepção, criando significado e permitindo que ele experimente uma realidade que só existe naquele encontro. Sem narrativa consistente, sem transformação sensorial e sem um território simbólico claro, o que resta não passa de decoração tecnológica.
A boa notícia é que o próprio público já percebeu isso. Ele não se deixa impressionar apenas por estímulos visuais. Ele busca vivência, não vitrines. E o mercado começa a reconhecer que o rótulo “imersivo” só faz sentido quando a ideia encontra um suporte capaz de levar a história adiante.
Por isso, a discussão agora vai além do “como deixar bonito” e entra no “como criar presença”. É nesse ponto que iniciativas permanentes de produção tecnológica, como laboratórios de artes imersivas e espaços dedicados à pesquisa de formatos, vêm provocando uma mudança real no setor. Ao permitir testar, iterar e produzir storytelling com menos desperdício e mais profundidade, esses modelos deslocam o foco de um espetáculo de superfície para uma mídia que dialoga com tempo, memória e subjetividade.
Algumas experiências recentes em projetos culturais e lançamentos de marca já mostram os efeitos dessa virada: o público deixa de ser plateia para se tornar protagonista; a revelação de um produto deixa de ser um truque para virar jornada; a cenografia deixa de ser cenário e passa a ser narrativa.
Imersão, portanto, não é um efeito especial: é uma gramática.
Se o mercado estiver realmente disposto a estudá-la, deixaremos de confundir novidade com inovação e começaremos a entregar experiências que têm algo a dizer. As marcas que se anteciparem a essa maturidade terão, inevitavelmente, vantagem competitiva, porque a memória não se forma apenas pela imagem, mas pelo sentido que ela carrega.
E, no fim das contas, é isso que fica: a história. A tecnologia só importa quando ajuda a contá-la.
Alexis Anastasiou – Diretor e fundador do Visualfarm Gymnasium









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