Alexis Pagliarini
COP 30 em Belém: risco ou oportunidade?

Por Alexis Pagliarini
Em novembro de 2025, o Brasil sediará a COP 30. Não há dúvida de que nosso país é um player de primeira grandeza no jogo das questões climáticas. Nada mais justo e natural, portanto, que tenhamos sido escolhidos para essa honrosa missão.
A cidade-sede, Belém, é emblemática, por estar na Amazônia, mas sua estrutura para sediar um evento dessa grandeza é questionável. Todos os 193 países e mais 5 territórios da ONU podem participar da COP. Para se ter uma ideia, só a delegação brasileira levou perto de 3.000 pessoas à última COP, realizada em Dubai. Uma COP reúne em média 80 mil pessoas por dia, com cerca de 140 mil inscritos. É muita gente para se transportar, acomodar e receber durante o evento! O governo federal formou uma secretaria especial para organizar o megaevento em Belém, ao lado do time local, contando com 30 servidores dedicados.
Estão previstas obras de infraestrutura, aterramento de fios, melhoria da estrutura viária e hoteleira, mas sabemos que nem sempre as coisas andam conforme o planejado. Lembremo-nos da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016. Havia novas linhas de Metro projetadas para São Paulo que até hoje não foram acabadas. Boa parte da infraestrutura projetada ficou no papel e só não passamos vergonha porque os eventos, em si, foram bem organizados e a hospitalidade brasileira prevaleceu na mente dos visitantes.
Não é a primeira vez que o Brasil sedia um evento com essas características. Eu morava no Rio quando aconteceu a Rio 92 e tudo funcionou razoavelmente bem. Mas a cidade de Belém não se compara ao Rio de Janeiro em termos de estrutura turística. Daí o título deste artigo. Será que estamos diante de uma oportunidade de consolidar a imagem do Brasil como um dos principais players das questões ambientais ou corremos o risco de um fracasso estrutural que pode colocar a perder todo o esforço feito para sediar o evento? Em termos de posicionamento, não podemos perder a oportunidade de mostrar ao mundo que estamos prontos para liderar a transição energética tão importante para neutralizar as mudanças climáticas e também nos fixarmos como um exemplo no estabelecimento de uma nova economia: a economia verde. Uma economia baseada em energia limpa e renovável e no uso de recursos sustentáveis, além de uma atitude regenerativa. Os últimos movimentos do governo, porém, se mostram erráticos, com a defesa da polêmica intensificação de prospecção de petróleo, por exemplo. Com uma matriz energética invejável e uma capacidade única de liderar a produção de hidrogênio verde, por exemplo, por que continuamos apegados à suja energia de origem fóssil?
Bem, essa é uma discussão para outro fórum. O que quero destacar neste artigo é a importância da organização do evento, em si. Precisamos encantar os visitantes e aproveitar o evento para pavimentar o caminho do turismo sustentável e atrair muito mais eventos e visitantes para o nosso país. Temos menos de 1,5 ano para nos prepararmos. Conseguiremos?
Alexis Pagliarini
COP30: Momentos de tensão

Por Alexis Pagliarini
Este é o terceiro artigo sobre a COP30 que escrevo por aqui. Desde o primeiro, já alertava sobre o risco iminente de colapso estrutural da cidade de Belém para receber um evento dessa magnitude. O que vemos agora é que a realização da COP30 em Belém, marcada para novembro de 2025, enfrenta um risco real — não pelas pautas climáticas, mas por uma crise humanamente previsível: a falta de hospedagem acessível e estruturada na cidade-sede. O que deveria ser uma oportunidade histórica para o Brasil se transformar em cenário de controvérsia por números: enquanto a expectativa é reunir cerca de 50 a 45 mil participantes, Belém dispõe de apenas cerca de 18 000 leitos formais.
O que já é um gargalo logístico transforma-se em crise quando se observa os valores praticados: hospedagens sendo oferecidas a até US$ 700 por diária — 10 a 15 vezes acima do preço normal — ou chegando a cifras surreais como R$ 100 000 por noite ou imóveis por R$ 2 milhões no período. Em uma comparação que beira o absurdo, uma acomodação passou de cerca de US$ 11 para US$ 9 320 por dia.
Diante desse colapso, o alarmante veio à tona com uma reunião de emergência realizada pela ONU em julho de 2025, quando delegações — sobretudo dos países em desenvolvimento — expressaram indignação e alertaram para possíveis cortes ou boicotes à conferência, se não houvesse resposta rápida. Alguns chegaram a pedir formalmente a transferência da COP30 para outra sede.
O governo brasileiro, confrontado com essa situação, se mobilizou. Firmou acordos com hotéis, articulou o uso de navios de cruzeiro com cerca de 6 mil leitos, ampliou alternativas como escolas, motéis, igrejas e a temida “Vila COP”, e manifestou o compromisso de apresentar um plano de mitigação até 11 de agosto.
Apesar disso, os efeitos permanecem preocupantes: consultas à nova plataforma de reservas mostram valores entre US$ 360 e US$ 4 400 por noite, além de quase 2 000 pessoas em lista de espera. O temor de exclusão de países e da sociedade civil cresce: se apenas os setores mais ricos conseguirem garantir hospedagem, a COP30 corre o risco de se tornar um evento elitizado, prejudicando sua legitimidade e o protagonismo brasileiro na agenda ambiental global.
Esse contexto é ainda mais delicado dado o cenário político internacional — com os Estados Unidos retirando-se do Acordo de Paris —, o que torna essencial que o Brasil conduza a COP30 de maneira simbólica e eficaz. Se falhar em garantir acesso equitativo, pode implicar em retrocessos diplomáticos e ambientais, perdendo uma oportunidade decisiva de reafirmar sua liderança e compromisso climático.
Em síntese, a COP30 já enfrenta um adversário real antes mesmo de começar: a incapacidade logística de oferecer hospedagem digna e acessível. Se os riscos — desde desertores até críticas globais — não forem contidos, o evento pode falhar em sua intenção mais básica: ser uma plataforma inclusiva para o futuro climático.
Alexis Pagliarini
Sem o “G” não há ESG

Nos últimos anos, tornou-se comum ver empresas declarando adesão aos princípios ESG. Sustentabilidade passou a fazer parte da narrativa institucional e muitos executivos citam a sigla com frequência em painéis, relatórios e apresentações corporativas. Mas, para além do discurso, é na prática cotidiana que se revela o verdadeiro compromisso — ou a sua ausência.
E entre os três pilares do ESG, é justamente o “G” de Governança que costuma receber menos atenção. Enquanto a pauta ambiental (E) e as ações sociais (S) ganham mais visibilidade, a governança — que diz respeito à ética, transparência, conformidade e responsabilidade nas relações — ainda é tratada por muitos como um item técnico ou burocrático. Isso é um erro estratégico e moral.
Governança é a base. Sem ela, os compromissos ambientais e sociais se tornam frágeis, oportunistas ou incoerentes. Um exemplo claro disso está na forma como algumas empresas, mesmo se dizendo “sustentáveis”, tratam seus fornecedores. É comum a imposição de prazos abusivos de pagamento — 120, 150 dias — que comprometem o fluxo de caixa de pequenos negócios e colocam em risco a sustentabilidade da cadeia produtiva. Essas práticas revelam uma lógica de curto prazo e lucro a qualquer custo, que vai na contramão dos princípios do Capitalismo Consciente, segundo o qual todos os stakeholders devem se beneficiar da atividade econômica, não apenas o contratante.
No setor de eventos, esse desafio se intensifica. A informalidade ainda predomina em muitos bastidores, com profissionais contratados sem registro formal, pagamentos por fora, jornadas exaustivas e ausência de condições mínimas de trabalho. Há, infelizmente, casos que se aproximam de regimes análogos à escravidão, especialmente na montagem e desmontagem de estruturas. A busca por redução de custos não pode ser usada como justificativa para negligência ética.
Além disso, vemos frequentemente práticas de concorrência desleal, favorecimento em processos de seleção de fornecedores, e, em casos mais graves, corrupção institucionalizada nos bastidores de grandes eventos. Não se trata apenas de “dar um jeitinho”. Trata-se de práticas que violam os fundamentos do ESG e perpetuam um modelo empresarial excludente, opressor e insustentável.
A verdadeira Governança exige:
Sem isso, qualquer ação “verde” ou “social” perde força. ESG não é um rótulo, é um sistema de valores que se traduz em decisões cotidianas — inclusive (e sobretudo) nas que ninguém está vendo.
É hora de o setor de eventos — e o meio empresarial como um todo — amadurecer sua compreensão sobre o “G”. Não avançaremos na construção de uma nova economia se continuarmos aceitando o velho modo de fazer negócios: informal, desigual e, muitas vezes, imoral.